Fiz o teste de DNA com meus avós e o resultado é surpreendente
- Juliana Sakae
- 3 de mai. de 2018
- 4 min de leitura
Atualizado: 3 de dez. de 2019
Há muito tempo tenho curiosidade de fazer o teste de ancestralidade via DNA, ultimamente tão popular nos Estados Unidos. O kit pode ser pedido online e custa $99 dólares cada, um preço um pouco alto para alguém que queria testar quatro pessoas (meus avós maternos representando minha mãe, meu pai e eu mesma). Decidi que eu começaria pelos meus avós, pois os resultados combinados seriam, teoricamente 50% do meu DNA [eu aprenderia depois que isso não é verdade]. Meu pai, sansei (neto de japonês nascido no Brasil), teoricamente teria 100% de etnicidade japonesa. Eu também aprenderia que isso não é verdade.

Quando comprei minha passagem para visitar minha família no Brasil, encomendei dois kits no site Ancestry.com (que não está pagando por este post, mas deveria) numa promoção de fim de ano por $69 cada. Fiquei muito ansiosa para saber dos resultados, mas primeiro eu teria de convencê-los a fazer o teste sem ofendê-los (por algum motivo me passou pela cabeça que eles achariam que eu estava fazendo um teste de paternidade, o que não faz sentido nenhum).
Antes de mais nada, passei horas conversando com eles sobre o meu projeto. Compartilhei tudo o que eu tinha aprendido até ali sobre nossos antepassados, mostrei fotos da viagem que fiz ao interior de Pernambuco para encontrar a misteriosa certidão de óbito da mãe do meu avô, mostrei os registros do navio Wakasa Maru que trouxe meu bisavô japonês em 1914 que achei na minha viagem a São Paulo. Essa etapa foi fundamental para eles entenderem a importância que esse teste tem para mim. Meus avós não ouvem muito bem, portanto, quando chegou a hora de dizer que eu queria levar para os EUA uma amostra do DNA deles eu escrevi uma carta e os entreguei em mãos. Expliquei o motivo, listei as instruções, contei quando sairia o resultado e o que esperar. Isso foi muito importante e eu diria que vou para sempre lembrar desse momento.
Para fazer o teste, o paladar deve estar limpo, então recomenda-se que se colha a amostra de saliva no mínimo meia hora após qualquer refeição. Trinta minutos exatos depois do almoço, minha avó veio me acordar da sesta preocupada: “Está na hora de fazer o teste!”, disse ela. Eu sorri, me levantei, peguei a câmera e fui atrás dela.

O teste é muito simples: você cospe até a linha “spit to here” desse tubinho. Ele vem com duas tampas: uma com uma boca larga que facilita na hora de colher a amostra (eles não tiveram dificuldade nenhuma, nem mesmo meu avô que sofre do mal de Parkinson e poderia não conseguir estabilizar o tubinho) e outra com um líquido azul vedado. Na hora que você fecha o tubo (com um pouco de força), o lacre interno dessa segunda tampa se quebra e solta o conservante que vai manter a saliva protegida até chegar ao laboratório do Ancestry em Salt Lake City, Utah.
Cada kit vem com uma caixa da UPS pré-paga. Eu trouxe na mala de volta para os EUA (com muito medo de tê-la extraviada) e logo ao chegar coloquei nos correios. Foram três semanas (de agonia) até sair o resultado! Era madrugada no Brasil quando eu recebi o e-mail do Ancestry. E os dados me surpreenderam.
Os resultados do meu avô:

Meu avô José Júlio, pernambucano nascido em Escada, no Engenho Noruega, vindo de uma família simples, com poucos registros, tem no seu sangue essa etnicidade incrivelmente colorida. Ao ver o resultado, me emocionei. Esse é o DNA do Brasil: colorido, miscigenado, intercontinental. Um pé na Europa, outro na África, outro aqui mesmo.
O exame mostra a porcentagem do seu DNA que se assemelha a um grupo étnico de alguma região do mundo. No caso do meu avô, esperávamos que ele fosse alguma mistura de tribos potiguaras com portugueses e africanos. Nossa surpresa foi saber que quase metade do DNA dele (46%) veio do sul da Europa, na região da Itália e Grécia. Apenas 16% da região de Portugal e Espanha, diferente da minha avó que tem 31% e é, como sabemos, descendente de açorianos e espanhóis.
Dos poucos pedaços de história oral que colhi durante minha pesquisa sobre meu avô, um é unânime: sua avó materna era “cabocla”, que entre muitas definições refere-se ao camponês filho do “branco” e do índio. Uma avó representa 25% do nosso DNA, mas não herdamos a etnicidade proporcionalmente. Por exemplo, se ela fosse 50% indígena e 50% portuguesa, sua filha, que herda apenas metade desse todo, poderia ter recebido uma porcentagem maior da etnicidade portuguesa que da indígena. Por exemplo, eu e meus irmãos somos descendentes de japoneses e de toda essa mistura que são meus avós maternos. Eu provavelmente tenho uma proporção maior de sangue indígena e africano que minha irmã, que tem a pele mais branca. Nossos resultados seriam parecidos, mas diferentes. Não é fantástico?
Os resultados da minha avó:

Minha avó é catarinense nascida em Florianópolis no dia 15 de setembro de 1926. Ela é tataraneta de um pirata espanhol que, conta a lenda, tinha um tesouro enterrado no fundo do quintal [aqui no blog eu uso a palavra trisavô para denominar o pai do bisavô e tataravô, o pai do trisavô]. Seu avô, João José de Souza Medeiros, é descendente de açorianos que migraram para Laguna, SC. Não é surpresa que a maior parte do seu DNA (31%) se assemelhe aos portugueses.
O mais interessante desse resultado são suas origens africanas (Nigéria 9%, Camarões/Congo 4%) e indígenas (4%), algo que tenho pesquisado há mais de dois anos [spoiler alert: meu livro será sobre essa jornada]. Minha avó também tem uma grande porcentagem irlandesa/escocesa/galesa (13%) e britânica (5%), o que abre um leque de possibilidades de pesquisa.




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